quinta-feira, 9 de abril de 2009

O Tempo de Ler


Em uma tarde chuvosa de sábado, fiquei a praticar aquilo que por dever profissional ou pura curiosidade se tornou um hábito: vasculhar a internet em busca de bons textos. Não procurei por Guimarães Rosa ou Machado de Assis; nem por Camus ou Dostoiévski. Desses, prefiro os livros.

Visitei sites de escritores contemporâneos conhecidos e alguns blogs, de atalho em atalho, de link em link, eventualmente paro para ler o restante de algum título interessante. E mais uma vez me deparei com o fantasma de Paulo Francis. É nome recorrente em textos vários, principalmente depois de morto.

Francis que tão bem conhecia Literatura talvez hoje debochasse, algo bem a seu estilo, de tanta gente sofrendo de certa “ansiedade cultural”. Desse mal sofrem as pessoas que, na primeira oportunidade, fazem questão de dizer que conhecem este ou aquele autor, leram este ou aquele livro, assistiram à última produção franco-indiana, estiveram na Flip, foram ao Festival de Cinema de Tiradentes ou jamais perderam um Free Gells Music.

Nesses tempos de inúmeros lançamentos, mídias, espaços; tudo ao alcance de quem estiver disposto a pagar, quanto não sofrem os que a todo momento precisam ler um livro “essencial”, visitar uma exposição “obrigatória” ou ver um show “imperdível”?

Nenhum produto cultural, seja de que espécie for, pode ser absolutamente essencial e imperdível. Pode sim, ser muito bom, mas para evitar filas e preços salgados no caso do filme prefiro esperar o DVD e quanto ao livro (salvo algum surto dentro de uma livraria) compro depois de alguns meses, ou nem isso. Quanto às exposições, sempre freqüentei menos do que gostaria, mas também não sinto falta.

Não quero levantar a bandeira daqueles que consideram a cultura um adereço sem importância, longe disso. Mas talvez seja saudável certa dose de ignorância, no sentido de deixar de lado parte do incontrolável volume de informação que hoje nos cerca. A lógica do mercado propõe consumir cultura, e cada vez mais gente o faz avidamente.

Dizer que foi ao teatro, viu tal filme, citar nomes e obras, enfim, demonstrar-se culto muda o conceito das pessoas a nosso respeito. Eu mesmo uso desse artifício para me entrosar de vez em quando ou justificar determinado ponto de vista, principalmente no trabalho. Mas é muito desagradável ouvir chutes absurdos em determinadas rodas e muito fácil notar descrições equivocadas que denotam um conhecimento raso ou incompleto de obras e autores importantes. Melhor calar, diria o príncipe.

É quando me lembro do Paulo Francis. Outro dia li que ele costumava mentir de vez em quando, sobretudo ao comentar shows e obras de arte. Francis fazia as vezes de crítico, geralmente depois de assistir a um espetáculo no Metropolitan Opera House ou de ter lido tomos e tomos da obra de um autor com nome estranhíssimo. Da forma como escrevia, não se podia duvidar que tivesse mesmo ido à ópera ou dedicado horas à leitura dos volumes.

Em seu texto, Paulo Polzonoff Jr. diz que Francis costumava mentir a respeito dessas coisas e se divertia com isso – o que é perfeitamente compreensível em se tratando de Paulo Francis. Mas penso que mesmo tendo mentido em suas colunas, ele jamais foi desonesto com o leitor. Porque nunca negou sua verve crítica e sua lucidez ferina. Dono de um estilo elegante de escrever, tinha um jeito único de “comentar” a realidade. Nisso, sempre foi generoso.

Não me tornei uma pessoa melhor por gostar de ler, nem adquiri bens materiais e desconfio que nem mesmo fiquei mais inteligente ou menos burro depois disso. E repito a pergunta que se faz Paulo Polzonoff Jr.: por que, afinal, lemos?

Depois do tempo que passei prestando atenção nos argumentos dele para ler ou não ler naquela tarde despretensiosa de sábado, fiquei a pensar no que teria “ganhado” com os livros. Nada de propriamente misterioso, divino ou transcendental. Na verdade é bem real, mundano e individualista, por mais paradoxal que pareça: ler ajuda a entender melhor o outro.

O inferno são os outros, dizia Sartre. Mas também pode estar em nós mesmos. Além do prazer momentâneo de uma passagem engraçada, a dor de uma separação, a agonia de uma espera ou o espanto diante de um final surpreendente, o livro revela suscetibilidades, carências, desejos, sonhos, defeitos e virtudes do ser humano.

Caímos na armadilha do autor e começamos a imaginar os personagens e as situações. Nessa espécie de transe o livro passa a ser nossa única preocupação, somos reféns do desenrolar da história e cada nova linha se torna urgente, imprescindível, inadiável.
É esse o tempo de ler.

(*) Jornalista

Problema nosso

Os governos, em todos os níveis no Brasil, têm sempre projetos para tentar afastar a juventude da criminalidade. Há uma infinidade deles, em praticamente todas as grandes cidades, e os mais comuns são os que utilizam o teatro, circo, artes plásticas e outras atividades lúdicas. Os resultados são esparsos, estão longe do que poderíamos chamar de solução.

Para piorar, há as distorções, ainda mais presentes nesse meio que já é, por si, carente de qualquer tipo de recurso. Habituamo-nos a vê-los nos cruzamentos bancando os malabaristas, engolidores de fogo e, quando não há o que apresentar, apenas pedindo esmola.

Não questiono esse tipo de iniciativa, até porque o problema do menor infrator no Brasil é dramático. Não passa um dia sem que eu veja um moleque maltrapilho e descalço circulando por aí. Alguns são simpáticos, conversam, brincam, correm entre os carros. Têm os olhinhos que brilham, olhos de criança.

Não vou bancar o hipócrita, também os evito quando quero. Passo rápido e evito olhar muito para não correr o risco de sentir pena, remorso ou raiva. E quando quero dou uns trocados, troco uma idéia, dou risada com as bobagens que eles, como qualquer criança, fazem.

Prefiro vê-los durante o dia. Quando cai a noite é mais triste, se amontoam debaixo das marquises, em lugares malcheirosos. Brigam entre si por causa de um cigarro ou pedaço qualquer de comida, resto de refrigerante e outras sobras que deixamos na rua.

A pior das sensações é quando eles encontram todas as janelas dos carros fechadas. Ninguém sequer olha na direção dos meninos. Os garotos parecem não se importar muito e no próximo sinal vermelho estão de novo a cumprir aquela humilhante rotina. Enfrentam o olhar enojado dos motoristas sem perder o pique.

Têm, também, os adolescentes de rua. Esses não causam nojo, dão medo. São temidos por causa da força física e também porque, em alguns casos, estão anestesiados. Não sentem p. nenhuma por essa gente que circula apressada pelo centro da cidade. E são perigosos mesmo: matam, roubam, traficam. São a parte mais visível da violência no Brasil.

São esses rapazes, de 16, 17, 20 anos de idade os responsáveis pelo trabalho sujo. Eles é que aparecem nas páginas policiais, ora como assassinos frios, ora como cadáveres. Estão jurados de morte, são procurados pela justiça. São eles os algozes da nossa sociedade que, mais do que nunca, hoje pede "Basta!"

Quem sabe quando exterminarmos esses jovens trogloditas fedidos que nos ameaçam na saída dos bares, na porta dos bancos, na fila do cinema, estaremos finalmente livres e felizes. Será? Parece ser essa a ótica de quem prega a antecipação da maioridade penal, pena de morte e outras mudanças na lei.

Fico aqui pensando, quando essas mudanças chegarem, o que vai acontecer com os deputados ladrões, juízes que vendem sentenças, delegados corruptos, policiais bêbados e outras aberrações desse país. Estamos ameaçados mesmo por esse exército de pivetes e pivetões, mas tão ou mais indigna e detestável é a palhaçada que há séculos fazem conosco, pagadores de impostos.

Claro que há os pivetões que se tornam mega-criminosos. São os chefões do trafico, tipo Fernandinho Beira-Mar e outros menos famosos. Alguns quase viram celebridades, como foi o caso do Marcinho VP. São casos distintos, onde o melhor é agir com rigor e inteligência. Estão acima do problema da desigualdade social do Brasil, porque existem também, guardadas as proporções e peculiaridades, nas sociedades mais ricas do planeta.

O nosso problema é diferente. Somos obrigados a aturar policiais mal-preparados e mal-remunerados que trabalham no limite do estresse. Não temos serviço de saúde nem escola gratuita de qualidade razoável – salvo raríssimas (e bota raríssimas) exceções. Somos uma sociedade atrasada, que não trata o próprio esgoto e mal tem previdência social. Alguém aí está tranqüilo com a chegada da aposentadoria? Temos alguns dos piores indicadores sociais do mundo. Se alguém deve ser responsabilizado, não pode ser quem não freqüentou escola, não tem emprego e todo dia é tratado feito cachorro. Cachorro de pobre, diga-se de passagem.

Para ilustrar, uma breve historinha que saiu nos jornais:


Sobrevivente de Vigário Geral é preso por tráfico (05/05/2005)

RIO - Vítor Santos Carlos tinha apenas 9 anos quando viu a sua casa ser invadida por homens armados e encapuzados. Naquela madrugada fria, de 30 de agosto de 1993, 21 pessoas foram assassinadas em Vigário Geral. Oito delas faziam parte da família do menino que, ao lado de outras quatro crianças, foi poupado na chacina. Onze anos se passaram e o sonho de ser mecânico ficou pelo caminho. Ao longo desse período, Vítor conviveu com o medo, freqüentou divãs e chegou a servir ao Exército. De nada adiantou. Sem dinheiro, entrou para o mundo do crime e, anteontem, foi preso.

Vítor foi preso no Complexo da Maré, com 97 trouxinhas de maconha e 63 sacolés de cocaína. Na 21ª DP (Bonsucesso), onde prestou depoimento, contou ter deixado a casa da tia, na Baixa do Sapateiro, em março de 2004, para vender drogas.

- Eu estava sem dinheiro e precisava sustentar minha mulher e minha filha. Ali cheguei a ganhar R$ 100 por dia - diz.

Não quero justificar nada. Lugar de bandido é na cadeia. Mas defendo a idéia de que, antes de adotar medidas radicais de combate ao crime, é preciso pensar seriamente em um modelo mais amplo, que contemple outras necessidades e urgências intimamente ligadas à opção dos jovens pelo crime.

Não adiantam os discursos, ainda mais se feitos no Congresso Nacional. Não adiantam as passeatas, nem as faixas ou as cruzes na praia. A criminalidade, a corrupção, o mau uso do dinheiro público no Brasil precisam ser resolvidos com o aval e a participação de todos os brasileiros. Inclusive dos que comem hoje e não sabem se vão ter como se alimentar no dia seguinte.

(*) Marcos Alves é jornalista e diretor de vídeos.

Houve um tempo em que queria ter nascido americano

Houve um tempo em que queria ter nascido americano. Do norte. Ter uma daquelas jaquetas bacanas e um tênis maneiro que via na TV, entre babando e triste por querer e saber que não ia ter. Tinha minhas roupas, evidentemente, mas da maioria eu não gostava.

E ficava a imaginar-me na rua, a porta do carro aberta e eu sentado numa mesinha na calçada ouvindo um som ao lado dos amigos e das meninas que fatalmente iam aparecer. Nessa hora, acordava e tinha e pela frente uma pilha de peças de automóvel queimadas no fogo para tirarmos os fios de cobre.

Era meu primeiro emprego e nada tinha de bom nisso. Ficava o dia inteiro esperando a hora de ir embora, lá pelas 6 da tarde. Ainda dava tempo de jogar pelada no campinho de terra perto de casa.

Daí em diante é puro delírio, esquecimento, histórias que ficaram para trás, lá atrás, quando ainda existia capim gordura, pamonha, fins-de-tarde luminosos, brincadeiras no quintal, as primeiras surpresas do amor e da liberdade de poder andar por aí sem ter muito com o que se preocupar.

O ruim é que lembrei-me da jaqueta ao pensar nos vinis que perdi com a chegada da maior novidade da indústria fonográfica, o CD, muito mais barato para produzir e reproduzir. O resto ficaria igual: direitos, distribuição, vendas, etc e tal. E as gravadoras deram o maior tiro, nem diria no pé, mas talvez na própria cabeça ao toparem a idéia e hoje assistimos à luta inglória da indústria contra a pirataria. Perdeu, baby.

Lançam uma coisa e logo aparece outra, gera um monte de sucata, um amontoado de plástico e todo tipo de porcaria descartada por aí, uma sensação de fim mesmo. Mas com o vinil aconteceu o contrário. Continuam únicos e ainda disputados.

Esse breve introdutório é para dizer que estou de saco cheio de novidade. Digo isso ouvindo rádio que estou, onde rola agora uma música brasileira da melhor qualidade, dessas eternas, de Dorival Caymmi a caminho de Maracangalha, com Anália a tira-colo, que a gente sempre torce por um final feliz nessa história. Até hoje.

Ouço muito bem, nitidamente, o som que rola na FM que agora posso acessar do computador, com essas caixas de som pequenas e boas; ou do celular, menos confortável por causa do fone que acaba sempre por machucar o ouvido.

E o pessoal sempre de aparelhinho novo no ouvido, em casa, no trabalho, nas empresas. Agora, com a crise, vem a notícia de um monte de demissões, mudanças, e quando melhorar vão anunciar cursos para formar uma nova leva de funcionários por causa de uma reorganização produtiva. Ou algo parecido.

Eu tenho por hábito torcer para o Fluminense, desde a época da jaqueta americana. Sofro feito um otário até hoje pelo tricolor, estou com dor de cabeça por causa do Botafogo, mas faz tempo que deixei de querer ser americano. Do norte. Gosto de ser sul-americano mesmo, brasileiro, mineiro e acredito que as coisas aqui poderiam ser melhores se houvesse a reparação de equívocos históricos, como a falta de uma política para a educação pública que poderia e deveria ter começado ainda no império.

Mas isso à primeira vista parece tão impensável quanto na época daquela bendita jaqueta. Em 2009 os tempos são outros e mudei, mesmo que o país não tenha mudado tanto nessas últimas décadas. Mudou na casca, mas não mudou na essência.

De todo modo, estou desencantado com a Política. Vivemos em plena democracia e as eleições se tornaram praticamente um hábito para a maioria dos brasileiros. Mas depois de vários embates eleitorais e tendo, especialmente, os mais recentes como lembrança, combinemos que não há muito o que comemorar. Há sim, o que mudar, há muito para melhorar. A começar no plano pessoal.

Passamos muito tempo preocupados em aprender as pequenas complicações do mundo, como usar o caixa eletrônico, o celular, o controle remoto da TV e esquecemos de interpretar direito o olhar de um filho, deixamos de retribuir um carinho feito com amor ou simplesmente não damos ouvidos a um murmúrio que, na verdade, é um pedido de socorro expresso com muita dificuldade.

Estamos presos ao nosso tempo, e por isso mesmo, devemos aprender a transitar dentro dele. Eis a mais dura, urgente e sábia tarefa a se entregar: compreender o próprio tempo. Para assim nele agir e mudar, primeiro, o próprio destino. Assim estará dado o primeiro passo na direção de um mundo melhor.

O segundo passo deve ser na direção da construção de uma sociedade melhor. Para isso dependemos uns dos outros e precisamos pensar um mundo onde todos possam viver em condições de igualdade. Nesse momento, teria, inevitavelmente, que voltar a falar de política. E teria que fazer um imenso esforço para acreditar que ainda vale a pena acreditar, mas vivemos tempos trabalhosos. E é melhor eu cuidar da minha vida, que o carnaval acabou.

(*) Jornalista

Médico de interior


Antônio Aurélio Filho, me garante o distinto senhor atrás do balcão, é o nome completo do médico popularmente conhecido como “doutor Toninho” em Paraguaçu, cidade do interior de Minas onde nasceu e trabalhou por décadas, até morrer.

Homem de temperamento forte, chegado um copo e repito, médico dos bons, “doutor Toninho” é personagem central de casos folclóricos, geralmente envolvendo outras pessoas da cidade em situações bastante interessantes. Deixou muitas histórias, e trago na memória algumas cenas dele ao lado de minha avó, de quem cuidou até o final da vida com atenção e competência.

Na época em que o doutor Antônio trabalhou o único hospital da cidade era administrado por freiras, com mão de ferro e rígidas regras de conduta. É possível imaginar o quanto o comportamento, digamos, “rebelde” do “doutor Toninho” incomodava as irmãs. Mas ele era natural da cidade, e como médico conquistara prestígio e respeito em todas as camadas sociais.

A conversa em torno do médico se estendia, enquanto apreciávamos uma cerveja gelada na tarde quente de Paraguaçu. O “seu Tião”, dono do bar, foi quem revelou o nome inteiro do “doutor Toninho” e, indagado sobre alguma história curiosa disse que certa vez o filho dele estivera internado com suspeita de meningite.

Os exames que poderiam comprovar a doença não podiam ser feitos em Paraguaçu, cidade carente de recursos. Para isso, o filho do “seu Tião” teria que ser transferido para outra cidade. À espera de uma definição, a família não arredava pé da porta do hospital.

Tarde da noite, o “doutor Toninho” chega - visivelmente embriagado, para visitar a criança. Meia hora depois, o médico volta e tranqüiliza “seu Tião” e os demais. “O rapazinho não tem sintoma de meningite, deixa ele aqui, vamos observar.”

No olhar do “seu Tião” percebo o carinho e o respeito pelo amigo de infância que tornara-se médico. O homem continua a narrativa. Logo que o doutor Toninho vai embora do hospital, a irmã-diretora chega para o “Seu Tião” e o aconselha a transferir o menino de hospital.

Coloca em dúvida a capacidade do Doutor Toninho de fazer uma avaliação confiável, mas recebe como resposta a exigência de que a transferência deveria ser documentada. Com uma simplicidade comovente, o “Seu Tião” me explica com serenidade e clareza que reagiu daquela forma porque não faria nada sem o conhecimento de um especialista. Afinal era o filho dele.

A irmã deveria assinar um termo de responsabilidade onde constariam todas as informações sobre o quadro de saúde do garoto e a justificativa para a transferência. Somente dessa maneira, a família da criança tomaria essa decisão sem o conhecimento do médico, ou seja, do doutor Antônio Aurélio.A irmã não levou a idéia adiante. O filho do “Seu Tião” tem hoje em torno de 40 anos de idade e ótima saúde, me garante o pai.

O doutor Toninho tinha o hábito prescrever receita em guardanapos, não se furtava a responder os mais estranhos questionamentos e, dono de senso de humor apurado, raramente perdia uma piada ou deixava escapar a chance de dar respostas cretinas ou maliciosas.

Quando perguntado sobre um bom remédio para hemorróidas respondia: chifre de carneiro. Parecido com um grande parafuso bastava, dizia ele, enroscar no local dolorido tal qual uma porca. Quando chegasse no fim da rosca, era necessário puxar com força para fora. Tiro e queda, garantia.

Certa vez, uma senhora bastante tagarela e conhecida na cidade perguntou a ele se era possível engravidar sozinha, apenas por ter usado um banheiro de rodoviária. Explicou ao experiente e bêbado médico que a filha havia sentado em um vaso sanitário sujo, repleto de espertos espermatozóides que acabaram fecundando a incauta menina.

“Isso é possível doutor?”, indagou a mulher de voz estridente, em tom quase autoritário - tamanha a ansiedade diante desse dilema familiar. O doutor Antônio bebeu o copo cachaça de um gole. Vermelho feito pimentão tossiu alto, foi até a porta e pigarreou na rua. Voltou-se para a futura a avó e soltou:

“É perfeitamente possível, dona. Basta que dentro do vaso tenha um... (aqui o nome do órgão é dispensável) desse tamanho!”