quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Belzonte




Quando o sol toca Belo Horizonte
por cima da serra do curral
a vida amanhece.

Lá vai buzão,
caminhão, charrete.
O audi, a moto, ô trem.

Mendigos na Praça Sete
A mulher usa o filho para pedir
e o olhar do filho

Cumplicidade e só
O que teu povo tem?
O melhor sempre fica
para quem tem mais.

Eu sou teu sangue
tuas pontes e montanhas
têm um pouco de mim.

Civilidade é teu nome
Liberdade, onde estás?

No caldo de feijão
Na pinga com limão
Na língua, na bucha

As mulheres mais lindas
desfilam nas praças
casais, namorados, amantes
Minas, teu nome é desejo

Tuas praças e esquinas
mantêm a elegância.
Gosto de vida mineira
Ô Minas Gerais.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Vida mudern@




Conheço um bocado de gente que vive reclamando de celular. Essas maquininhas diabólicas são capazes de incomodar até as pessoas mais reservadas, que acabam sendo convencidas a comprar um aparelho, para que possam ser – oh, tristeza, localizadas.

Privacidade, onde estás? Hoje ninguém mais tem sossego com esses aparelhinhos apitando no bolso, na bolsa, no porta-luvas, em tudo que é canto. Mas nada se compara, em termos de aborrecimento, com o momento em que ligamos para a operadora para reclamar do serviço.

É um labirinto de incompetência onde o sujeito conversa com 4 ou 5 pessoas – o jogo de empurra é interminável, e não resolve absolutamente nada! O tom do atendimento é absolutamente impessoal: começa com uma gravação que explica em quais teclas terei a resposta que procuro. “Se você já é cliente, tecle1; se não é cliente, tecle 2, se é sobre celular, tecle 3....” e por aí vai.

Isso quando não temos que dizer ao telefone o que queremos, como se estivéssemos em um país exótico, tendo que soletrar cada palavra. Isso mesmo, temos que falar com o robô do outro lado o que nos aflige.

Eu não sei de onde importaram isso, mas é esquisito demais, e no Brasil fica ainda mais engraçado. Consigo imaginar no Japão ou outro país distante com gente afeita a conversar com máquinas – mas não aqui.

Aperto a tecla que diz que vou ser atendido por gente de verdade, “um de nossos atendentes”, e suspiro aliviado quando ouço “Pois não, senhor?” de alguém de carne e osso do outro lado da linha. Nesse momento, ainda calmo e paciente, acredito sinceramente que conseguirei resolver o problema.

Mas a moça não vai conseguir resolver. Não está ao alcance dela, aliás pouquíssimas decisões podem ser tomadas por esse pessoal do “Call Center”. Nome sonoro, anglo-saxônico, que não faz a menor diferença na vida do coitado do assinante, cliente, ou seja lá como os “Call centers” nos conhecem. Acho que depois de desligar eles nos chamam de babacas mesmo, aqueles que compraram o telefone e aderiram ao plano do qual vão se arrepender inutilmente mais tarde.

A moça transfere a ligação, fico ouvindo a gravação da operadora por mais algum tempo. Outra pessoa atende e diz: “Eu vou estar transferindo a ligação para o setor responsável, é só aguardar.” Essa frase detestável é dita por alguém com voz de autômato do outro lado da linha. Segue um tempo indescritível, coisa de 3 ou 4 minutos, em que vaza uma gravação dizendo que a ligação é muito importante e que um dos atendentes não vai demorar para atender. Nessa brincadeira já se passaram mais de 15 minutos, desde que decidi ligar para reclamar.

Finalmente alguém atende. ‘Em que posso ajudá-lo, senhor?” Eu explico pela enésima vez que preciso mudar de plano, comprei há 6 meses e há pouco tempo fiquei sabendo que é 3 vezes mais caro que o de uma amiga, com as mesmas vantagens, preço etc.

Adivinha? O sujeito pede para eu aguardar. Volta aquela musiquinha irritante, eu já querendo desligar, quase vencido pelo cansaço. Minutos depois (já foi quase meia hora de “negociação”) sou informado que não posso mudar de plano. E que, se optar pelo cancelamento, vou pagar multa! Isso mesmo: ou eu fico com eles ou terei que pagar multa, algo assim como um divórcio com pensão alimentícia.

Fico bravo, xingo, digo que aquilo é absurdo e que, embora o atendente não tenha culpa de fazer aquele trabalho de merda. A empresa engana o consumidor, e ele é pago para ficar ouvindo impropérios como os que eu disse sem poder fazer nada para resolver o problema.

Não à toa, as operadoras de telefonia lideram o ranking de reclamações nos procons, Brasil afora. Colocam um exército de telefonistas sem a mínima autonomia para ouvir o cliente, mais nada. Apenas ouvir e depois re-pe-tir o mesmo texto, sistematicamente sabe Deus a que custo emocional, que eu já estava às turras. Pode ser um caso de saúde pública, sabidamente há perdas dos dois lados.

O atendente me pergunta se é só isso. Eu digo que é, não há nada a fazer. Ele começa a ditar um número enorme, diz que é o número do protocolo. Protocolo para quê, meu Deus? Ele me diz que é praxe. Toda reclamação tem protocolo.

É claro. A picaretagem se alimenta pela burocracia. O serviço mal-feito que se garante em cláusulas duvidosas de um contrato unilateral baseado em uma gravação telefônica – exatamente o negócio deles! Essa conversa tinha que terminar mesmo com um número de protocolo. É a cara do nosso país.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

TESTEMUNHA OCULAR



Estava lá e ouvi: “O Conca é o pior jogador do Fluminense hoje!” Incrível. O mesmo Conca, brasileiros e brasileiras, que agora domina as listas de melhor jogador do campeonato. E também vi o mesmo Conca, dez minutos depois do comentário acima, meter dois golaços no São Paulo e colocar o tricolor carioca de novo na liderança desse campeonato brasileiro que chega perto do fim com o Fluminense campeão.

Além da vitória gigante do Flu, a ida a Barueri, na grande São Paulo, é o pretexto desta crônica. Foram 35, 40 minutos de trem no leve balançar do velho vagão que vai dando um sooooooono na gente, impensável em uma ida ao estádio de futebol. Fico pensando em porque construíram aquele negócio, a Arena Barueri.

Havia um time lá, o Grêmio Barueri, mas que agora é Grêmio Prudente porque “mudou de cidade”, estabeleceu-se em outra freguesia. Em Barueri a mina secou. O time surgiu de uma parceria, destacou-se em um ou dois campeonatos anteriores, mas sem alma, tradição, um time dificilmente consegue existir sem dinheiro. Existe até sem torcida, mas sem dinheiro não rola.

Restou o estádio que só deve receber grandes jogos até a copa.

A Arena Barueri é de acesso complicado nas proximidades e fica a uma boa distância da estação Jardim Belval, por onde chegam muitos torcedores. Muita mais gente ainda vai de carro e perto não tem estacionamento suficiente. Torna perigoso até um jogo como esse em que o São Paulo não tinha mais chances e a torcida levou até faixa pedindo pra entregar o jogo.

Na saída, a torcida do Fluminense teve que esperar pelo menos uma hora para chegar até onde estavam os ônibus de caravanas e os vários estacionamentos - tipo feira onde se alugam barracas pra vender. No caso, aluguéis de pequenos galpões e garagens particulares estampadas em avisos, placas improvisadas e mal escritas, empurradas no gogó mesmo.

Tinha também os ambulantes tradicionais, vendendo suas camisas e bonés.

Mas isso a gente já conhece e não tem problema afinal cada um sabe o que está comprando e os caras precisam ganhar um dinheiro no fim de semana. Afinal vender nem sempre é roubar, apesar de algumas multis e a receita fazerem isso com a gente direto. Nada a ver com cambista, incluindo boizinhos de classe média comprando meia e vendendo a preço de inteira.

O estádio deve ficar às moscas em breve, mas tomara que alguém faça alguma coisa para impedir que apodreça, papel das lideranças locais, mas só vai acontecer algo de bom ali se a comunidade fazer-se representar de verdade, indo às reuniões e intercedendo nas decisões. E ‘olho vivo’ que tem gente que se vende baratinho.

Foi um aperto a saída do jogo...

Uma barreira do batalhão de choque se formou na saída acanhada da Arena de Barueri. A rua foi interditada. Depois de uma goleada de 4 x 1 sobre o São Paulo e a taça de campeão brasileiro de 2010 muito próxima das laranjeiras, a torcida cantava na saída do estádio e assim chegava na rua cercada pela polícia. A aglomeração era inevitável e mais gente chegava: crianças, mulheres, idosos, rapazes, meninas, adultos, bebês. Do lado da rua, um barranco de uns sete metros de altura de onde brotavam, é mais ou menos isso mesmo, as frágeis colunas que sustentam as pequenas casas.

Uns oito ou nove malandros corriam por ali e isso explica a primeira de várias correrias no entorno da lateral do estádio. Pelo portão de onde saímos só havia duas saídas possíveis. Bloqueadas porque a esta altura o barulho era na outra ponta do quarteirão. Ouvimos sons de bombas soltadas pela policiais, sinal de que a coisa não estava boa mesmo. Tinha um corintiano armado por perto.

Imaginem todas essas pessoas se espremendo na lateral do estádio a cada correria. Eu via os pais atarantados tentando reunir a tropa a cada sinal do alarme que era sempre aos solavancos. A linha de frente, formada pelos integrantes das “organizadas” do Fluminense tratava de engrossar ainda mais o caldo.

Policiais chegaram ao alto do barranco e perseguiram os caras que apareceram do nada. A polícia não liberava a saída e algumas pessoas entraram de novo no estádio forçando um dos portões para sair pelo outro lado. Hesitei. Fiquei onde estava sentei na grama perto da entrada arrombada. Neste tempo todo passou um filme na minha cabeça.


Como vai acabar?

Como em outras ‘roubadas’, ficava matutando nos meus filhos com medo de levar porrada e chegar ensangüentado, ir para um hospital e telefonar para casa avisando. Pensava naqueles pais e mães ali do meu lado.

Depois de mais uns 15, 20 minutos resolvi entrar pelo portão. Com esforço segurei a porta pesada e torta que permitiu a invasão presenciada pelos policiais e passei. Foi quando notei com o canto do olho que a barreira da rua finalmente era liberada. Segui pelo corredor e ainda passei pelo banheiro, onde joguei uma água no rosto. A rua estava movimentada, era noite e respirava aliviado no caminho de volta para casa.

Tinha o trecho até o trem e sentia um pouco de inveja do pessoal que saiu com a camisa do Fluminense no corpo. Como toda forma de amor, é um sentimento inexplicável esse nosso por um time de futebol. Mas bastou 5 minutos para ver uma moça e dois ou três rapazes sendo atacados covardemente. A moça caída no chão e os amigos se defendendo com bravura. A bronca acabou com a chegada de uma viatura da Guarda Municipal.

E a copa vai ser aqui...

Ir ao estádio no Brasil é uma aventura porque as autoridades se preocupam mais com o horário da transmissão do que com o torcedor. Nosso país avançou nos anos FHC e Lula, passou de coadjuvante a jogador, virou titular dos BRIC’s no Campeonato Mundial, mas está longe de entrar para o G4, o bloco dos melhores países do mundo.

Simples. Da janela do trem dava pra ver dois cenários perfeitamente distintos na tarde ensolarada de céu aberto que nos abençoou o domingo: de um lado as favelas compridas que acompanhavam a linha férrea. De outro, sobre uma imensa planície alguns quilômetros adiante cortada pela rodovia Castelo Branco, os prédios suntuosos de Alphaville.

Ao redor dessa paisagem, a maioria dos brasileiros vive como pode. Mora lá longe e trabalha, gosta de bebida, sexo, música e futebol – não necessariamente nessa ordem, e se arrisca nessa terra adorada, apesar dos pesares.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

O ET e o BBB



Este texto foi escrito na época do BBB que teve a Siri e o Alemão (lembram-se?), como participantes. Mas acho que mantém sua atualidade, afinal...a febre das celebridades instantâneas continua



Estava na janela e olhava lá para fora. O céu estava estrelado, como na maioria dessas noites entre o verão e o outono. Foi quando vi o clarão, o flash por trás dos galhos da árvore à minha frente, cuja copa tapava parte das luzes da cidade. Cenário com o qual habituei-me nos últimos 15 meses.

De repente salta dali um homenzinho verde, um ET que vai logo puxando papo.

- Diga lá, meu camarada! Não assusta não, sou de paz, assim como você. Como vão as coisas?

- Quem é você, de onde veio?

- Você já ouviu isso, mas vou repetir pela milésima vez: sou de um planeta distante, posso viajar a anos-luz por hora, falo a sua língua e posso ler seus pensamentos. Enfim, sou bem mais evoluído que você.

Gostei da franqueza do cara, apesar de pequenininho era abusado e parecia divertido.

- Você tá meio chateado...

O Etezinho chegou com a corda toda e já dando palpite. Pelo menos agora tinha alguém para conversar.

- Estou sim, meio solitário. O pessoal não está me dando muita bola.

- Cadê o pessoal? Sua mulher, as crianças...

- Olha Verdinho - vou te chamar assim tá? Os últimos 70 e poucos dias não têm sido fáceis, ando num enclausuramento noturno involuntário, justo quando quero conversar com o pessoal aqui de casa. Antes, todos riam das besteiras que eu dizia ao entrar na sala. Agora, estão todos na frente da TV ou do computador vendo o Big Brother Brasil.

O ET se ajeitou na folhagem para me ouvir. Era mais ou menos do tamanho de um galo, usava uma roupa engraçada e botas de cano bem alto, tudo verde, inclusive ele. Ouvia minhas queixas com atenção.

- As crianças ainda consigo tirar dali, mas minha mulher não arreda o pé. O relacionamento está abalado, quase não nos falamos ou quando isso acontece é só para as coisas práticas, o básico do dia a dia.

- Mas você não tenta uma aproximação?

- Tento, quando chego perto e faço um carinho ela até retribui, mas não é com aquela atenção que eu gostaria. É só um beijinho de raspão, rapidinho, desses que a gente nem sente direito. Nem bem viro o rosto e a vejo de novo com os olhos vidrados no tal de Alemão. Sinto que estou perdendo terreno.

- O caso é sério, tens um inimigo forte. Já ouvi falar dessa Globo.

- Já, ET?

- Já. Tem gente que vem de longe piratear o sinal para outras galáxias. Ninguém faz TV tão bem quanto na Terra. E a Globo é uma das melhores, brasileiro é bom em futebol e televisão.

- E carnaval. Música e outros esportes além do futebol.

Percebi o olhar de aprovação do ET. Estávamos ficando amigos.

- Posso sintonizar a Globo daqui.

- Dentro da nave tem tv?

- Não, sintonizo aqui mesmo - disse, apontando para a cabeça redonda com duas anteninhas parecendo uma barata verde cibernética. Continuei minhas queixas.

- Armei minhas barricadas, adotei estratégias de guerra, mas pouco tem adiantado, os resultados são ridículos. Consigo pouco mais que um "O que foi?", dito assim de qualquer jeito - às vezes repetido com ênfase para corrigir o pouco caso, mas aí é tarde. Meu coração está irremediavelmente atingido. Não sou mais a atração noturna, o cara que chega da rua com as novidades, os chocolates ou a cervejinha para um papo de fim de noite. Sou o incômodo, o sujeito que vai mudar de canal ou então ficar ouvindo música em outro lugar da casa. E o pior é que a coisa não fica restrita ao horário do programa. É um tal de Siri no Faustão, Flávia no vídeo-show, Fani no caldeirão... As mulheres são bacanas e tudo, mas não consigo ficar o tempo todo vendo e ouvindo aquilo. Daqui à pouco vão colocar ex-BBB ao lado do Galvão Bueno. Aliás, nem futebol deixa as pessoas assim! Até o Bial ficou nervoso no dia que o cowboy foi eliminado. Acho desproporcional e meio forçado, artificial.

- Olha, é artificial mesmo, mas o mote não é a simulação da realidade? É típico dos tempos que você vive aí na Terra, não acha? Mas daí a você se indispor em casa, é um pouco demais, não? É só lembrar daquela lei elementar: gosto não se discute.

O ET me ouvia, mas ficava a maior parte do tempo com os olhos fechados. Percebi que ele estava "assistindo TV" e gritei:

- Ô Etezinho, sacanagem pô, eu aqui me queixando justamente desse negócio de televisão e você aí, vidrado? Tá parecendo o pessoal aqui de casa!

O ET fez um sinal com a mãozinha, para eu falar baixo.

- A Analy e o Diego estão conversando. Acho que no próximo paredão eles vão votar na....

- Peraí, ET, pode parar! Até você vai ficar nessa de Big Brother??

Ele dá um passo no ar, flutua em minha direção para dizer no meu ouvido:

- Fica frio, daqui a duas semanas acaba. É só um programa de TV, não tem importância. Agora me dá licença.

E sumiu no meio da folhagem, com a mesma rapidez com que apareceu do nada. Assim como as celebridades do Big Brother, com excessão da Grazi. Putz.